O legado da crise na cultura organizacional

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Walking the Talk

Este artigo aparece e é reproduzido com permissão do principal jornal financeiro do Brasil, Valor Econômico, a partir da versão original publicada.

The crisis legacy in organisational culture

Para Carolyn Taylor, as crises podem ser oportunidades, sejam elas motivadas por fatores internos ou externos. 

Durante uma crise econômica, as empresas brasileiras se acostumaram a um novo conjunto de normas - fazer mais com menos, responder à pressão constante por resultados e trabalhar em equipes muito mais enxutas. Para a consultora Carolyn Taylor, especialista em cultura organizacional, mesmo com a recuperação da economia, os efeitos da recessão serão sentidos por muito mais tempo e cabe aos gestores definir se a crise deixará um legado ou uma maldição para as empresas.

Cultura corporativa é, na visão de Carolyn, um termo que define os comportamentos diários e as formas de fazer as coisas dentro de uma empresa. "Você constrói sua cultura pela forma como trabalha todos os dias. Sua resposta a uma crise é um exemplo dessa cultura", diz a autora do livro "Walking the Talk". O título também dá nome à sua consultoria, fundada há 30 anos e presente no Brasil há mais de uma década.  

Para ela, os momentos de crise, sejam eles prolongados e impulsionados por fatores externos, como uma recessão econômica, ou gerados por aspectos internos, como escândalos de corrupção ou acidentes ambientais, devem ser encarados como momentos de oportunidade. A chave para isso é assumir a responsabilidade e apontar um espelho para a organização, identificando as atitudes que levaram à crise ou que foram tomadas em resposta a ela. "Algumas culturas culparão o ambiente externo e outras se perguntarão como podem se tornar mais inteligentes e aprender com o que aconteceu", diz ela. 

Exemplos como as empresas denunciadas por corrupção na Operação Lava Jato ou no Banco Wells Fargo, onde se descobriu que milhares de funcionários abriram contas em nome de clientes sem autorização, mostram que a empresa dificilmente pode negar responsabilidade e apurar irregularidades em algumas "maçãs podres". "Não consigo pensar em nenhum caso em que encontrei um ou dois indivíduos que cometeram fraude, mas sim, houve uma cultura mais ampla contribuindo para isso", diz ela. 

Em sua experiência, quase sempre é possível identificar onde há vulnerabilidades que podem levar a irregularidades e fraudes durante a análise da cultura de uma empresa. “Pode ser por uma cultura de descontrole, ou pressão exacerbada para obter resultados sem questionar como eles serão alcançados”, diz. Principalmente em momentos de crise, quando essa pressão vem de todos os lados, ela argumenta que as empresas sempre buscam vagas que permitam aos funcionários encontrar “atalhos” para melhorar o desempenho. 

“É irresponsável pressionar uma organização sem fazer essas perguntas, e é nesse ponto que os executivos seniores contribuem para uma cultura que causa problemas”, diz ela. As vozes que exigem melhor desempenho e as que reforçam os valores e a ética devem ser ouvidas no mesmo volume, diz Carolyn. "Na maioria das organizações, a voz da ética e dos valores não é alta o suficiente", diz. 

Na ausência de uma liderança atenta, as crises tendem a elevar o medo entre os funcionários, o que traz à tona o que há de pior nas pessoas. "Existem duas maneiras de liderar durante uma crise, uma é com visão e a outra é com medo", diz ela. Ter uma visão exige ser muito específico e transparente sobre as necessidades da empresa e o papel dos funcionários dentro de sua estratégia - além, é claro, de tomar decisões sobre cortes e demissões com "dignidade". “Para exigir mais das pessoas, você deve ser capaz de transmitir um maior senso de propósito, e ter muito cuidado para que as exigências ocorram apenas no curto prazo, porque as pessoas não ficarão se sentirem que estão sendo abusadas, " ela diz. 

Segundo sua experiência, cerca de metade das empresas são capazes de fazer essa autoavaliação e saem das crises mais fortes do que antes. No Brasil, Carolyn percebeu que é mais fácil as pessoas aceitarem as mudanças e se apegarem menos ao passado, em comparação com a Europa, mas também vê uma grande limitação na dificuldade dos brasileiros em ter conversas duras e falar abertamente sobre seus problemas - algo essencial para a evolução da cultura corporativa. 

Outro aspecto que ela aponta como vantagem na economia brasileira é a prevalência de empresas familiares que, em sua opinião, são mais comprometidas com o longo prazo. “Cultura corporativa é um empreendimento de médio prazo, você não vai ver resultado em alguns meses”, diz ela. Para a consultora, é preciso esperar dois ou três anos para realmente ver o impacto que uma crise pode ter na cultura organizacional de uma empresa.  

Carolyn está otimista, porém vê uma consciência crescente no mundo corporativo de que é possível e necessário analisar e refinar as culturas das empresas. Para ela, isso é consequência de muitas crises que quase destruíram empresas, da chegada de uma nova geração de executivos e executivas ao poder, mais à vontade com a gestão de assuntos antes tidos como bastante "menores", e da necessidade sentida por empresas se tornem mais ágeis e adaptáveis a um mundo acelerado e incerto. 

A agilidade é hoje a habilidade mais procurada pelos executivos que buscam fazer diagnósticos e mudanças na cultura de suas empresas. Dar mais poder e autonomia aos colaboradores vem a seguir, como requisito para permitir mais agilidade nas organizações. “É uma grande mudança em termos de confiar, delegar e aprender a resolver os problemas de forma horizontal, sem precisar consultar sempre os gestores, o que demanda mais tempo”, diz. Para complementar, ela destaca dois outros aspectos importantes da cultura: a curiosidade de aprender constantemente e a humildade de saber que nem sempre as respostas estão lá. 


Para ler a versão original do artigo, clique aqui

 

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